No centro daquela aldeia
Tinha uma oca levantada
E dentro daquela oca
Muitas redes armadas
Entorno da grande oca
Outras pequenas iguais
E por trás de tudo isso
A baia dos animais
Gracinha muito assombrada
Quase não desembarcava
Não fosse por Monira
que malvada lhe encarava
Porem não era só ela
Que estava a lhe observar
Mas todas as vermelhas
Que nesta hora estavam por lá
A velha já morreu?
Foi Monira a perguntar
Ainda não foi não
Tá te esperando chegar
Disse que num fecha os olho
Sem otra no seu lugá
Monira andou na frente
Das graças a lhe seguir
E moribunda como estava
A velha ainda pode sorrir
quando viu entrar aquela
que ela pensava
ia lhe substituir
Gracinha lhe pediu benção
Lhe beijou a testa gelada
E viu que Monira chorava
Na beira da rede ajoelhada
Tá aqui a ingrata
Que eu disse que ia trazê
Mas vou deixa ela mesma
Fala o que tem pra dizê
A velha com a voz bem fraca
E com a mão de gracinha segurada
Pediu que Monira saísse
Que agora ela cuidava
Do assunto que tinha
E pelo qual tanto ansiava
Monira queria ficar
A velha nem lhe respondeu
E logo do seu lado
Outra velha apareceu
Lhe fez sinal com os olhos
E a amazona cedeu
Quando Gracinha ficou
Sozinha com a Vó
Essa lhe disse
Num rápido fôlego só
Minha filha tu me escuta
Que outra vez num hei de falá
A vida dá a dita
E a nós cabe aceitá
Sei que tu vem me dizê
Que num qué daqui cuidá
mas tu tem que sabê
que num pode recusá
por que desde Una até mim
ninguém pode disso escapá
é teu destino Das Graças
tu tem que ele aceitá
a monira qué sê cunha
e isso eu num posso deixá
por que tu foste inducada
pra ficá no meu lugá
cada tempo que passa
nossos costume se perde
as mulheres da igreja
do nosso sangue tem sede
foi por isso que te criamo
com branca educação
pra que tu tivesse conhecimento
pra salvá o nosso povo
da grande devastação
que há de vir qualquer dia
mas isso eu não vô ver não
já comi coração de padre
que veio me maldizer
já fiz beata de igreja
água benta bebê
pra saber que num sô diabo
pra ela de mim se benzê
tivemos que enfrentá
muita gente enfezada
e na historia da vila
fomo muito ameaçada
como se não fosse nós
que abrimo a premera picada
Quando nós decidimo
Que tu ia sê diferente
Era na esperança de tu salvar nossa gente
A velha deu uma tossida
Gracinha ficou assutada
Pois ela mesmo
Ainda não tinha dito nada
A velha continuou
Das Graças minha filha
Não vá nos abandonar
Se tu não fica aqui
Pouco vamo durá
Desde que tu nasceu
Muitas já foi simbora
Muito já se perdeu
Seja nossa Cunhã
É o que te peço eu.
Dos olhos de gracinha
Grossas lagrimas pingavam
E suas certezas de antes
Em duvidas se trasnformavam
A velha olhou pra ela
E disse numa risada
Mas ninguém tinha me dito
Que tu já tá embuchada
Gracinha enxugou a cara
Não to não Cunhã
É inchaço de estrada
Vá se vê ca parteira
Que eu sei que não to enganada.
Gracinha se tremeu toda
Lembrando da Xícara de chá
Então a filha de Raimundo
Era dela que ia chegar
********************
Depois que Gracinha saiu
Raimundo foi procurar
A sua embarcação
Que disse Tiriri
sabia donde tá
foram pelo mato
até nela chegar
Raimundo correu pra dentro
E deu uma gaitada
Pois lá dentro estava
Brotada a orquídea malhada
Com a ajuda de Tiriri
pegou as provisões
mas deixou a flor no barco
pra lhe evitar confusões
não tomo esse chá agora
por canseira de assombrações.
Tiriri avisou Raimundo
Que precisava voltar pro barracão
Que era dia de jogo
E não podiam perder não.
Voltaram correndo com as coisas
Que Raimundo queria levar
Pra dar pra Mae Tiana
Na intenção de lhe agradar
Quando por lá chegaram
Tava armada a confusão
Um entra e sai de gente
De dentro do barracão
Os homens sem camisa
Dançavam pelo chão
Viu quando Tiriri pegou
Um arco e um cordão
Amarrou uma cabaça
Pegou uma pedra na mão
Tirou a ponta da flecha
E com ela bateu no ferro do arco
E tudo aquilo junto
Fazia um som muito alto
Raimundo ficou olhando
Sem muita coisa entender
E sem saber direito
o que ia acontecer
Tiriri falou pra ele
Que era um jogo antigo
Que lembrava do tempo
Das lutas contra inimigos
O arco a gente usava
Pros miseravi flexá
A cabaça servia
pra mó de se alimentá
e essa pedra nós usa
disse rindo
pros passarinho matá.
e tem chocalho de pedra
pro malzagoro espantá
Quando se perdia na floresta
E precisava se encontrá
Nós ajuntava tudo
E fazia barulhá
Um toca daqui
outro responde de lá
Mas sempre acabava em briga
Pru que os inimigo
Também podia se achá
E hoje nós toca e nós briga
Essa briga de jogar
E isso tudo nós faz
Pra lembrá dos ancestrá.
Eu vou levar as coisas pra mãe Tiana
E volto já já
Tiriri pegou as coisas
E foi correndo guardar
Disse pra Raimundo
Pra na roda se sentá
E que ficasse tranqüilo
Que se num fosse pra ele
Num precisava jogá.
Raimundo sentou num canto
Fora da roda ficou
Mas foi o mesmo preto velho
Que lhe deu o fumo
Quem pra roda lhe chamou
Venha pra cá seu Raimundo
Não precisa se assustá
Que por aqui só joga
Quem for mesmo pra jogá
Mãe Tiana veio de dentro
E disse que era pra começar
E disse pra Raimundo
Que aquelas coisas roubadas
Ele voltasse a embarcar
Que por ali não podiam
Aquelas coisas aceitar
Raimundo abaixou a cabeça
E ficou triste a cismar
até que uma cantoria
fez ele de novo se espertar
“Tiriri venha pra roda
Que nós vamos lhe contá
Como foi que aqui chegamo
Num navio que era um currá
Ai me diga preto velho
to aqui pra lhe escutá
por que é aqui que estamo
e onde havera nós de está
Já faz mais de muitos anos
Nos vivia em outro lugá
Era um reino bem bonito
E nós era os rei de lá
Nosso povo era de guerra
Mas guerra de conquistá
Lá nós num se acorrentava
E brigava de iguá pra iguá
Um dia chegaro os branco
E começaro a atirá
Botaram nós num barco
E trouxeram nós pra cá.
Preto velho então me conte
Que eu quero sabê
Então eu era o rei
Antes disso acontecê?”
Soaram mais fortes os arcos
E todos cantaram juntos
Eu era rei do reinado de oxalá
Iansã, oxum, Oxossi,xangô, Orunmilá
Eu já fui nobre do reino de Oyó
Onde Oranmiyan defendeu Oduduwá
Nosso povo é de paz
Isso eu posso provar
Pois Oranmiyan deixou
Adimu também reinar.
Em terra de gente forte
Um homem se acovardô
E Oba Ajaka foi sucedido por xangô
Ê ê ê na minha pele preta ninguém vai batê
Êêê na minha pele preta ninguém vai batê
Soaram mais altos os instrumentos
E o Preto velho e Tiriri começaram a jogar
Enquanto Raimundo muito estranho
Sentiu seu corpo arrepiar
e aquela cantiga nunca antes ouvida
ele também se pôs a cantar.
Os homens se arrumaram
Em fila pra jogar
E depois dos dois primeiros
Vieram outtro e se puseram a cantar
Exu Guardou templo
Ogum ferro esquentou
Oxossi trouxe a caça
Logunedé pescou
E foi Omolu
que com milho me curou
Corre daqui , pula de lá
Vai pedindo a bença pro seu orixá
Joga daqui, jinga de lá
Dos ferros dos branco
Eles vão te livrá
Tem sete cores o arco de Oxumaré
E somos todos filhos de Iyami-Ajé
O meu cabelo quem me deu foi yewá
E dos meus filhos é obá quem vai cuidar
Corre daqui , pula de lá
Vai pedindo a bença pro seu orixá
Joga daqui, jinga de lá
Dos ferros de escravo
Eles vão te livrá